Relatos de parto

Liz e Bernardo

Hulyanna e Elizabeth

Vou tentar escrever algo aqui sobre a viagem mais louca que eu já fiz, graças a mulher mais incrível que eu conheci nessa vida!
Mas sei que não conseguirei passar para vocês, tampouco para ela, o tamanho da minha admiração e a grandeza do meu amor. Quem conhece a Huly sabe que não é atoa que ela é do único signo regido pelo sol. Luz e força são palavras obrigatórias do leonino. Huly me mostra isso todos os dias, mas me transbordou de certeza, no momento do parto do Bernardo e da Liz...
Durante a gestação, foram batalhas contra insônia, dispneia, exaustão, edema, anemia, rinite, hiperêmese, lombalgia, hipertensão... Dois sangramentos inabituais e prematuridade vencidos! Mas uma certeza que ela sempre carregou e carrega é que tudo se deu, se dá e se dará com o propósito de Deus. Todas as dificuldades são aprendizados e todas as alegrias, presentes…

Até mesmo a via de parto.: Um aprendizado. Um presente. Ela decidiu que se a natureza a guiasse para um parto normal, ela venceria mais esse desafio.
Na minha cabeça, a possibilidade de perder a briga era real! Eu, tecnicista, não conseguia harmonizar os dizeres - 39 semanas, gemelares, parto normal - e me posicionei na retaguarda. Já ela vestiu sua melhor armadura e tomou a frente...

Segunda-feira, à noite.
Iniciou em casa, dez horas de fase ativa de trabalho de parto. Sob o chuveiro quente, de joelhos, abraçando uma bola de pilates. Sofa, quarto. Quarto, sofá. Massagem. Escalda pés. Deita, sentada. Acompanhada de perto pela doula Mirian e pela enfermeira Rose. 

A cada contração, um gemido interiorizado. Ela sabia que seria assim. Mas ela conhece seu corpo e estava conduzindo a fisiologia da gravidez de modo mais resiliente possível.
Combinamos que era só me dizer uma única vez se o seu limite chegasse para eu intervir.
A noite acabou. Equipe assistencial foi para casa. 

Madrugada.
Contrações voltam. Agora ritmadas e curtas a cada 3 minutos. 3 a 4 cm de dilatação. Chega a enfermeira Rita e ligamos para Dra Avelina que orienta ir para o hospital.

Internação às 3h.
Inspira, expira. Contrai. Ri, mas não chora. Contrai.
Dor, muita dor. Irradiada da virilha para a pelve. O corpo dela se moldou para gerar duas vidas e nessa reta final, deu um gás. 6 a 7 cm de dilatação.
Em alguns momentos, ela nos diz que não vai dar conta, mas logo se recompõe. Miriam, Rita e Dra Avelina a postos. 
Epidural às 5h.
Era preciso recarregar o corpo por um momento. Dormiu.

Terça-feira, de manhã.
O que Huly fez naquela sala de parto foi transcendental!
Eu vi. Ninguém me contou!
Ela despiu a armadura que a protegia e entregou-se de alma, nua. Pq era ela que ia proteger agora, eles.
Música em alguns momentos, silêncio em outros.
Fotografias da nossa história penduradas na parede da sala, ao lado de frases encorajadoras. Uma equipe de parto humanizado completamente fora da curva!
Várias posições para parir. Eu nem sabia que existiam tantas! Uma posição era proposta, ela experimentava.
A manhã demorou passar e ao mesmo tempo passou rápido. Esperando o corpo dela se abrir naturalmente para nos trazer duas vidas.
Eu não sentia meus pés, mas não sai do lado dela em nenhum momento. Beijei. Tentei fazer rir. Levei xingo.
Segurei forte sua mão. Eu reconheceria seu limite. E não foi ali.

12:36
Sentada. Num banquinho. Apoiando suas costas em mim.
Concentrada, ela respirava fundo e atuava.
Brilhantemente.
Direcionava sua força. Ouvia e seguia os comandos da equipe.
Para cada "não vou dar conta" que dizia, ela voltava com mais empenho na próxima contração...
Bernardo nasce! Carequinha! Chorando com vigor.
Um sentimento que não tem definição. Ficamos as duas abraçadas a ele. Parecia que o tempo passava em câmera lenta.
Voltei à realidade quando ouvi Dra Avelina dizer
"vamos deitá-la na cama, está sangrando!" Muito sangue no chão, aos meus pés. Huly fraca, mal conseguia se levantar. Só respondia com o balançar da cabeça.
Minha pressão cai. Mirian me dá apoio, milho assado e a mão para apertar forte! Eu choro como criança, mas  ela ali como uma mãe e não como uma doula, não me deixa sair do eixo.
Eu quero entender o que está acontecendo! Cadê a monitorização dela? Novamente: cadê a monitorização dela!!!
Dra Avelina me puxa novamente para a realidade: "Beth, Huly está bem! Já vão monitorizar! Ela precisa de vc aqui, ainda tem a Liz!" 

Sangramento controlado.
Liz! Meu Deus! A Huly ainda precisa parir a Liz!
Rodo o quarto com o Bernardo no colo!
Ficou sem espaço para mim. Huly, Dra Avelina, Dr Janone, Rita, Mirian, Milene e Liz! Um show onde cada um realizou perfeitamente o seu papel!

12:54 
Eu vejo a cabecinha dela. Cabeludinha! No canal esperando a próxima força máxima da Huly.
Liz nasce! Chorando com vigor!
Escuto Dr Janone me chamar "Beth, vem cortar o cordão!"
Cordão? Nunca cortei um cordão!
Cortei sim! O do Bernardo.
O êxtase do momento anestesiou minha memória.
Liz colocada ao lado do rosto da Huly.
Me junto a elas com o Bernardo por um um breve momento. E vibro pela nossa família! 

Huly só tinha energia para respirar. E sorrir de canto de boca. Sabia que tinha chegado ao final do que se propôs a vencer. E, pode parecer exagero meu, mas o que pra ela fez parte da jornada, eu não teria feito metade…